A política tributária é um dos principais instrumentos de distribuição de renda de uma nação, mas, para que cumpra seu papel, é necessário que o sistema tributário tenha como princípio a progressividade na forma de incidência. Para que um tributo seja progressivo, é preciso que tenha mais de uma alíquota e que essas alíquotas incidam de forma crescente, conforme aumenta a base de cálculo ou a faixa de renda.
A experiência internacional mostra que os impostos indiretos, ou seja, os tributos cujos ônus podem ser transferidos a terceiros pelos contribuintes, total ou parcialmente – como, por exemplo, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) -, tendem a ser menos eficientes em realizar o princípio da progressividade, uma vez que incidem sobre o consumo.
Já os impostos diretos – ou seja, os tributos cujos contribuintes são os mesmos indivíduos que arcam com o ônus da respectiva contribuição – tendem a alcançar níveis de progressividade maiores, como é o caso do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, de suma importância para a reorganização do sistema tributário brasileiro em bases mais justas.
Uma das principais questões que se colocam sobre o IRPF, é a forma de correção da tabela, de modo que a estrutura de contribuição dos assalariados ao fisco seja mantida. Isso porque, se os salários são ajustados à inflação corrente e a tabela de incidência do imposto não o é, os rendimentos dos trabalhadores são corroídos em termos reais. Nesse sentido, a reivindicação mais premente da sociedade em relação ao IRPF é a correção anual da tabela atual pela inflação e, em seguida, a criação de uma nova estrutura de tributação que contemple novas faixas de rendimentos.
Entre 1996 e 2017, a tabela de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física, segundo o IPCA-IBGE, acumula defasagem de 88,5%. Se for considerado somente o período compreendido entre janeiro de 2003 e dezembro de 2017, essa diferença corresponde a 35,10%. Deve-se observar que de 1996 a 2001 e nos anos de 2003, 2004, 2016 e 2017, os valores da tabela não foram reajustados.
Em dezembro de 2006, no âmbito de um acordo formalizado entre as Centrais Sindicais e o governo federal, no qual foram pactuadas regras para uma política de valorização do salário mínimo, estipulou-se que, entre 2007 e 2010, a tabela do IRPF teria uma correção anual de 4,5%. Em 2011, de forma unilateral, o governo decidiu manter o percentual de reajuste em 4,5% e o aplicou até 2014. Já em 2015, concedeu-se reajuste diferenciado por faixas de rendimento, o que resultou em aumento médio de 5,60%. Desde então, a tabela permaneceu inalterada.
Deve-se ponderar que apenas a correção para atualização dos valores da tabela do IRPF não é suficiente para alterar a estrutura da contribuição e torná-la mais justa para os assalariados. O artigo 145, § 1º, da Constituição Federal de 1988, determina que “sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte…”. O princípio da capacidade contributiva estabelece a isonomia entre os diversos rendimentos, tratando diferentemente os desiguais, o que pressupõe, além da correção da tabela, uma estrutura de alíquotas mais adequada.
As alterações ocorridas no decorrer dessas quatro décadas – e que resultaram na diminuição do número de faixas de renda de 16 para 5 e na redução da alíquota máxima de 60% para 27,5% – impuseram um modelo tributário injusto, que acaba por incluir um maior número de trabalhadores na última faixa, favorecendo aqueles que possuem maior capacidade contributiva, ou seja, os mais ricos.
A tabela do IRPF vigente desde o ano-calendário 2015 é composta por cinco faixas de renda tributável. Todos os rendimentos superiores a R$ 4.664,68 mensais são tributados pela alíquota de 27,5%, mesmo os que superam dezenas de milhares de reais. Isso significa que um rendimento de R$ 4.664,69 e um de R$ 80.000,00 serão tributados com base na mesma alíquota. Assim, há espaço para que seja definido um maior número de faixas para as rendas mais altas, o que, inclusive, compensaria a perda na arrecadação do imposto causada pela correção da tabela do IRPF.
*Resumo da Nota Técnica nº191 de Fevereiro de 2018. Nota técnica completa aqui