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EM ENTREVISTA AO SINTAJ, ANA GEORGINA DO DIEESE ESCLARECE SOBRE AS MUDANÇAS DO IRPF

A lei que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) foi aprovada na última quarta-feira (26), isentando quem ganha até R$ 5 mil por mês e determinando desconto para rendas de até R$ 7.350 mensais.

Diante das mudanças, o SINTAJ entrevistou a economista Ana Georgina da Silva Dias, Supervisora Técnica Regional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), para esclarecer dúvidas da categoria.

Ana Georgina, Supervisora Técnica Regional. FOTO: ACERVO PESSOAL

SINTAJ- O QUE MUDA NO IMPOSTO DE RENDA PARA PESSOAS FÍSICAS (IRPF) EM 2025 E QUAL A IMPORTÂNCIA DESSA MUDANÇA?

ANA GEORGINA  – A principal mudança é exatamente o aumento do limite de isenção. Antes da sanção da Lei, o limite era de dois salários-mínimos, que hoje é um valor de R$ 3.036,00. Esse valor aumenta para R$ 5.000 e, acima deste valor até R$ 7.350, existem algumas deduções que são regressivas, ou seja, quanto mais perto de cinco mil, maior é o percentual de dedução até o limite de R$ 7.350.

Estas são as duas mudanças fundamentais, além da criação de uma tributação para pessoas físicas que têm rendimento acima de R$ 600.000,00 por ano, ou seja, acima de R$ 50.000,00 por mês, que também é uma alíquota progressiva que pode chegar até 10%.

Lembrando que para as pessoas que recebem R$ 5.000,00 e essa renda é oriunda apenas do trabalho, permanece a alíquota de 27,5%, não existe essa alíquota adicional de 10%. Uma outra coisa interessante de se destacar é que, como acontecia antes, esse valor de R$ 5.000,00 não é abatido, por exemplo, dos valores das pessoas que têm rendimento acima de R$ 5.000,00 ou desses R$ 7.350,00 e para quem tem rendimento acima desse último valor, permanece a forma usual de tributação do imposto de renda.

SINTAJ – COM A ATUAL MUDANÇA, COMO SE CONFIGURA A REALIDADE DE TRABALHADORES E TRABALHADORAS?

ANA GEORGINA  – Essa mudança é extremamente importante porque nós tínhamos a isenção para pessoas que recebiam até dois salários-mínimos. Isso já alcançava praticamente 70% dos trabalhadores. Elevando a parcela isenta para R$ 5.000,00, isso significa dizer que nós temos mais de 90% dos trabalhadores e trabalhadoras isentos de pagar o imposto de renda no país, visto que temos rendimentos muito, muito baixos.

Para aqueles trabalhadores eventualmente acima de R$ 7.350,00, precisamos lembrar que, de alguma maneira, ainda que não tenham sido contemplados agora, esses trabalhadores e trabalhadoras normalmente já possuíam alguns mecanismos que ajudavam também a deduzir parte das suas despesas, sobretudo com educação, saúde, no pagamento do IRPF, o que significava uma restituição maior, sobretudo para as pessoas de maior renda.

Então, nós podemos dizer que, em termos de justiça tributária, essa medida foi positiva. Embora também precise se destacar que as faixas, as alíquotas ainda são muito penosas para os trabalhadores que recebem acima desse valor de R$ 5.000,00 e que também poderiam ter sido de alguma maneira compensados. Basicamente, se fosse feita a correção da tabela do imposto de renda, mais trabalhadores e trabalhadoras poderiam ter sido contemplados.

Mas, não podemos esquecer que grande parte dos trabalhadores e das trabalhadoras será alcançada por essa medida. Então, a medida é positiva.

SINTAJ – O ANTIGO MODELO DE COBRANÇA DE IMPOSTO PENALIZAVA AS CAMADAS MAIS POBRES, FINANCEIRAMENTE FALANDO. ESSA CAMADA PODE SER IDENTIFICADA  A PARTIR DE UMA RENDA? QUAL?

ANA GEORGINA  – Sim, penalizava basicamente a grande maioria dos trabalhadores. A isenção de dois salários-mínimos já alcançava, basicamente, quase 70% dos trabalhadores e das trabalhadoras. Então, a partir desse limite até R$ 5.000,00, uma parcela importante de trabalhadores passou a ser isenta. Hoje temos praticamente 95% de trabalhadores e trabalhadoras que foram beneficiados por essa medida.

Não há sombra de dúvida em dizer que os trabalhadores que têm menor rendimento acabaram tendo um benefício maior, um retorno melhor dessa medida. Aqueles também entre R$ 5.000,00 e R$ 7.350,00, que também é uma outra parcela interessante, ainda que não seja isento, também vão ter alguma redução naquilo que pagam.

Então, basicamente, os trabalhadores que não foram alcançados por essa medida são aqueles que ganham acima de R$ 7.350,00, que infelizmente, no Brasil, significa dizer que são poucos trabalhadores, em termos percentuais. A grande parte, infelizmente, ganha entre um e três salários-mínimos.

SINTAJ – EXISTE UMA RELAÇÃO ENTRE A DEFASAGEM SALARIAL E O IRPF?

ANA GEORGINA  –  Essa pergunta é excelente e existe uma relação sim. Basicamente, quando a gente não tem reajustes salariais e não há, como há muito tempo não há, uma correção da tabela do imposto de renda, significa dizer que, basicamente, os trabalhadores vão tendo um efeito desse imposto, maior sobre a sua renda. Se a tabela não é corrigida na medida em que a inflação avança e os salários também não avançam, significa dizer que um percentual da renda está sendo corroído exatamente por essa inexistência de correção.

Inclusive, o Sindifisco Nacional, o Sindicato dos Trabalhadores e trabalhadoras da Receita Federal, tem uma proposta além da própria questão da isenção dos R$ 5.000,00, mais uma proposta de reajuste da tabela do IRPF, o que, segundo eles, talvez trouxesse uma justiça tributária ainda maior.

SINTAJ – COMO AS ENTIDADES SINDICAIS CONTRIBUÍRAM PARA ESSA MUDANÇA DE COBRANÇA DO IMPOSTO DE RENDA?

ANA GEORGINA  – As entidades sindicais foram fundamentais em pautar essa mudança, essa reforma no IRPF. Como já se sabe, houve sempre uma reivindicação pela correção da tabela do IRPF, pela inflação acumulada do período, já que a tabela é extremamente defasada, além da própria criação de outras faixas, de outras alíquotas.

Temos poucas faixas e alíquotas, o que acaba fazendo com que as pessoas paguem muito imposto de renda, quem vive do trabalho, proporcionalmente, em relação a quem vive de renda. Essa tem sido uma reivindicação muito importante do movimento sindical e, ainda que se possa fazer algum tipo de crítica em relação à nova Lei de isenção do imposto de renda, o avanço é muito significativo, porque uma parte muito significativa mesmo dos trabalhadores e das trabalhadoras será beneficiada por essa medida.

O que a gente é, que trabalhadores que recebem salário acima da média no Brasil, lembrando que essa média é muito baixa, o rendimento médio no Brasil, no trimestre de 2025, foi de R$ 3.200,00. Então, os trabalhadores que recebem acima desse patamar de R$ 7.350,00, de fato, permanecem como estão. Não tem um benefício imediato, além do de saber da questão da solidariedade de classe, que a maior parte dos trabalhadores, sobretudo aqueles que têm rendimentos menores, estão isentos.

Mas também, não podemos deixar de pensar que ainda seria necessário que essas alíquotas fossem revistas, tanto a quantidade quanto a própria questão da correção da tabela do imposto de renda. Mas, ainda assim, é um avanço importante.

SINTAJ – QUEM SERÁ OBRIGADO A PAGAR IMPOSTO DE RENDA A PARTIR DE 2026?

ANA GEORGINA  – A partir do próximo ano, vão ser obrigadas a declarar imposto de renda exatamente as pessoas que têm rendimento acima de R$ 5.000,00 mensais. As pessoas que têm rendimento menor que esse valor estão isentas, porque basicamente a Lei foi sancionada exatamente para isentar esses trabalhadores e essas trabalhadoras.

Então quem recebe R$ 5.000,00 por mês e R$ 60.000,00 por ano, em tese, estariam isentos de pagar o IRPF, acima disso, todos são obrigados a pagar o imposto. Inclusive o imposto não e só sobre o salário, é importante dizer que é sobre renda e proventos de qualquer natureza. Mesmo a pessoa que viva de renda, aluguel, investimento, ela está obrigada a pagar o imposto de renda.

SINTAJ – QUAIS GASTOS PODEM SER DEDUZIDOS DA BASE DE CÁLCULO DO IRPF?

ANA GEORGINA – Os gastos dedutíveis no pagamento do imposto de renda são gastos com saúde, previdência privada, previdência pública, educação. Tem alguns outros critérios, algumas outras possibilidades de isenção, deduções para pessoas representadas, que têm dependentes com algum tipo de deficiência. São vários critérios que acabam contribuindo para a dedução de valores gastos com esses tipos de itens do imposto a ser pago.

SINTAJ – QUEM ESTIVER ACIMA DOS R$ 7350,00 PODE CONTRATAR UMA PREVIDÊNCIA PRIVADA PARA ATINGIR O VALOR DA ISENÇÃO, POR CONTA DA DEDUÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA DESSES VALORES.

ANA GEORGINA – Na verdade, pode e isso já é feito, não há mudança nenhuma, isto é previsto. No entanto, ela tem que lembrar que ela vai pagar a previdência privada, então ela terá uma maior restituição, mas porque ela também terá maior gasto. É preciso ficar atento a isso.

SINTAJ – UMA DAS DÚVIDAS DA CATEGORIA DO JUDICIÁRIO É, SEGUNDO A TABELA, A ISENÇÃO OU COBRANÇA INCIDIRÁ SOBRE O SALÁRIO BASE OU A SOMA DESTE COM OUTRAS VANTAGENS?

ANA GEORGINA – O imposto de renda sempre vai incidir sobre aquilo que é sua remuneração habitual. Não somente habitual, basta perceber que nos meses que têm férias, 13º, algum tipo de rendimento além da sua remuneração habitual, também é pago o imposto de renda, é pago em cima dos rendimentos.

Como eu disse, o imposto de renda é imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. Então, se o servidor do judiciário receber, por exemplo, aluguéis, rendimentos, dividendos de aplicações e investimentos sobre os quais incidem o imposto de renda, ele tem que pagar sobre esse conjunto, não é só sobre a renda do trabalho.

SINTAJ – A ALÍQUOTA DIMINUI  PARA QUEM GANHA POUCO MAIS QUE O LIMITE DE 7350,00?

ANA GEORGINA – As alíquotas não diminuem, permanecem as mesmas. No entanto, o que acontece é que existem algumas deduções, no próprio imposto de renda na fonte, para as pessoas que ganham entre R$ 5.000,00 e R$ 7.350,00. E essa dedução é regressiva, ou seja, é mais para quem ganha mais perto de R$ 5.000,00 e vai diminuindo até quem ganha R$ 7.350,00.

SINTAJ – SOBRE A CRIAÇÃO DA ALÍQUOTA PARA RENDIMENTO A PARTIR DE R$ 600.000,00, COMO SERÁ O ALCANCE DELA?

ANA GEORGINA –  É importante dizer que a criação da alíquota para quem tem rendimentos, proventos, renda a partir de R$ 600.000,00, vai alcançar 140 mil pessoas. É um número de pessoas pequeno, em relação a um universo que temos de contribuintes, importante.

Lembrando que quando a renda de R$ 50.000,00 for basicamente uma renda do trabalho, fica mantida a mesma regra atual, que é dos 27,5%. Essa mudança para a alíquota progressiva, que pode chegar até 10% para quem ganha a partir de R$ 600.000,00 no ano, atinge outros rendimentos que não sejam a renda do trabalho.

Outra coisa sobre esse valor de R$ 600.000,00, tem alguns rendimentos que também estão isentos além do trabalho. Ganho de capital, herança, doações, rendimentos recebidos acumuladamente, poupança, aposentadoria por moléstia grave e indenização. Então, não é qualquer renda.

SINTAJ – O CONGRESSO, COM MEDO DA REPERCUSSÃO DO POVO, APROVOU A ISENÇÃO COM RESSALVAS: QUE NÃO FOSSEM APROVADOS O AUMENTO DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF) E NÃO HOUVESSE A TAXAÇÃO DOS SUPER RICOS.  QUAL O RESULTADO PARA A ECONOMIA DIANTE DESTA ALTERNATIVA?

ANA GEORGINA – A repercussão sobre a economia é que isso acaba criando um certo problema em relação à questão das receitas do governo sobre a arrecadação. É importante lembrar que essa reforma, essa mudança, não tem o caráter de melhoria de arrecadação, ela tem um caráter neutro, ou seja, basicamente aquilo que o governo sugeriu no Projeto de Lei para ser feito em contrapartida a essa isenção, ou seja, o aumento do IOF, a taxação dos super ricos de forma mais vigorosa e outras medidas, ela tinha o caráter, basicamente, de compensar aquela perda de arrecadação por conta da isenção e da dedução para as pessoas que recebem até R$ 7.350,00.

Então, ela não tem um caráter arrecadatório, ou seja, de aumento de arrecadação, é um caráter basicamente de compensação. Então, se o que é necessário para compensar não tem a possibilidade de ser completamente arrecadado por conta das mudanças no Congresso, isso significa um prejuízo para a sociedade na totalidade, que vai ter perda de receita.

Lembrando que, por exemplo, as bets, que são hoje em dia bastante polêmicas, questionáveis, tinham também a possibilidade de taxar esse tipo de empresa e o Congresso rejeitou. Basicamente, não existe uma razão plausível para isso. Quem perde é a sociedade.

Lembrando também que a parcela de imposto isenta dos trabalhadores que hoje pagam e vão deixar de pagar, de alguma maneira, será tributada. É preciso lembrar que o Brasil ainda tributa majoritariamente de forma indireta, ou seja, uma tributação no consumo. Então, supondo que essa parcela de renda não vai ser utilizada para pagar imposto, mas será utilizada no consumo, de qualquer maneira o governo acaba arrecadando também.

No entanto, a gente poderia ter uma compensação muito mais imediata e mais direta, se esses impostos e essas mudanças, em algumas tributações, tivessem sido aprovadas como propostas.

SINTAJ – HOJE, SE UM(A) SERVIDOR(A) RECEBE R$ 8000 E PAGA R$ 2000 DE IRPF, QUANTO IRÁ PAGAR NO PRÓXIMO ANO? SERIA POSSÍVEL EXEMPLIFICAR A PARTIR DESTES DADOS?

ANA GEORGINA – Para quem está nessa situação, em tese, não tem mudança, não é isento e não tem dedução, basicamente vai pagar o que continua pagando hoje. A maneira de pagar menos ou mais, se fosse o caso, seria se houvesse uma mudança nas alíquotas e no próprio limite de isenção, uma correção da tabela do imposto de renda. Para as pessoas que recebem a partir de R$ 7.351,00, não há mudança.

O SINTAJ trouxe um exemplo de um servidor que ganha R$ 12.363,14, com todos os vencimentos e descontos, e pedimos à entrevistada que explicasse o que aconteceria no IRPF deste servidor. Segundo Georgina, basicamente para esse servidor não haverá mudança, não tem isenção e nem dedução como as pessoas que recebem entre R$ 5.000,00 e R$ 7.350,00. Isso porque não houve nenhuma medida específica para quem ganha acima de R$ 7.350,00.

A supervisora do DIEESE reafirma: não é sobre o salário base, o IRPF incide sobre sua renda, inclusive meses em que você tem um aumento de renda, seja por 13º, seja por férias ou qualquer outra coisa que receba.

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