SÃO PAULO – As maiores dificuldades do que se previa inicialmente para o governo na manutenção de apoio confortável para derrubar as denúncias apresentadas pelo procurador-geral Rodrigo Janot contra o presidenteMichel Temer voltam a apontar para um cenário que põe em xeque os resquícios de “wishful thinking” do mercado sobre a possibilidade de aprovação da reforma da Previdência depois da hecatombe provocada pelas delações de executivos da JBS.
As incertezas quanto à consolidação de uma maioria em torno da permanência do peemedebista desenham um quadro em que a existência de base de 3/5 dos parlamentares em ambas as casas para que impopular proposta de emenda constitucional seja aprovada não mereça outra qualificação senão a de improvável.
Evidentemente, nas atuais circunstâncias, tampouco seria prudente acreditar em qualquer favoritismo para a formação de um grupo de 343 deputados dispostos a aceitar a denúncia em plenário, mesmo que ainda haja muita água para passar debaixo da ponte e muitas flechas a serem lançadas da PGR.
Se de um lado, “não falta bambu”, do outro, falta base de apoio para uma retomada do ritmo da agenda de reformas. O governo tenta sinalizar normalidade por meio dos avanços da reforma trabalhista no Senado. Do lado da Previdência, existe a possibilidade de uma nova desidratação do projeto originalmente encaminhado pelo ministério da Fazenda. Ainda que seja mantida apenas a questão da idade mínima em 65 anos, falta clima político para que a matéria seja votada e aprovada.
Todos os esforços do governo estão concentrados na denúncia que hoje tramita na Câmara dos Deputados e nas outras peças que ainda são esperadas do procurador Janot. Com as maiores dificuldades em conquistar apoio, o Palácio do Planalto começa a dar sinais de preocupação com eventual necessidade de antecipar a abertura dos cofres para negociar com os deputados e acabe sem moeda de troca em momentos mais importantes no futuro — por exemplo, durante a própria decisão do plenário.
Ao mesmo tempo em que tenta manter parcela importante da base de sustentação de seu governo no nível da política, Michel Temer também sabe que não pode descuidar do apoio dos mercados — importantes fiadores da agenda de reformas e que deram voto de confiança importante no início de sua gestão. Agora, cabe ao peemedebista não abandonar o discurso de otimismo com a retomada da agenda de medidas estruturais para o ajuste fiscal no futuro próximo.
Neste momento, a reforma da Previdência sobrevive quase exclusivamente no campo da retórica, em um esforço narrativo do governo para acalmar os investidores e garantir sua sobrevivência até o fim do mandato, em 2018. Se antes se falava que a PEC 287 precisava ser aprovada ainda no primeiro semestre deste ano, visto que a aproximação do calendário eleitoral traria prejuízos à matéria e poderia até inviabilizá-la, hoje vende-se a esperança de que ainda seria possível aprovar a proposta antes das próximas eleições.
Na Câmara, parlamentares experientes definem um novo deadline para a reforma: se passar de outubro, a janela de oportunidade definitivamente estaria fechada. Até lá, muita especulação e “wishful thinking” enquanto o teto de gastos ameaça cair sobre a cabeça de Temer ou do desafortunado sucessor.
IMPRENSA/A previdência é nossa